quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Um mundo melhor


Se eu estivesse prestes a criar um mundo para os meus filhos, como ele seria? Bem que poderia ser muito parecido com esse; mas esqueça os terremotos, vulcões, furacões, tornados, tsunamis, tempestades solares, meteoritos, efeito estufa, secas, pragas, enchentes, eras glaciais. Num mundo criado de acordo com a minha vontade, essas coisas só existiriam no cinema, que era para onde as pessoas iriam se quisessem ver como seria um mundo sem um ser supremo que as amasse.
Valendo-me da minha perfeição, eu teria criado o ser humano perfeito. E de uma vez só, como, aliás, era o que se achava que Deus tinha feito. Nada de deixar tudo à mercê de um processo evolutivo que levaria bilhões de anos e infestaria seu DNA de erros e mutações sem fim, que teriam como consequência previsível o surgimento de todo tipo de doenças e disfunções que só causariam sofrimento desnecessário. Não que haja sofrimentos necessários, mas, talvez, sofrimentos inevitáveis, como o da rejeição de um amor não correspondido, ou o provocado pela ausência de alguém que foi embora ou faleceu. 
No meu mundo as pessoas viveriam duzentos anos, e só morreriam de velhice. Recorrendo aos meus poderes supremos, eu jamais permitiria que ninguém sofresse um acidente, um machucado, um arranhão que fosse. Ninguém se afogaria, ninguém seria atropelado ou assassinado. Todas as pessoas do mundo me conheceriam e saberiam da minha presença, porque eu estaria dentro da mente de cada uma, fazendo com que elas se enxergassem como um todo, como parte de algo infinitamente maior chamado humanidade, vendo a si mesmos em cada um de seus semelhantes.
E se, por algum motivo impensado, uma pessoa levantasse a mão para outra, eu apareceria a tempo de impedir que essa mão baixasse. Quando um carro perdesse os freios, ou um avião perdesse a força das turbinas, eu surgiria do nada para evitar uma catástrofe. E se um vaso despencasse de um prédio, eu o conduziria suavemente até a calçada, ante os olhares agradecidos dos transeuntes, já tão acostumados a me ver apelar para a minha onipresença e onipotência de forma a nunca deixar que nada de mal acontecesse a ninguém. 
Eu não iria interferir no livre-arbítrio da minha criação, exceto se essa prerrogativa fosse usada para ferir ou prejudicar seu semelhante. Mas isso seria uma raríssima exceção. Como eles veriam o outro como a si mesmos, não haveria crimes nem ofensas, nem motivo algum pelo qual matar ou morrer, como diz uma certa canção. Ninguém em sã consciência usaria de seu livre-arbítrio para ferir-se ou prejudicar a si mesmo. E eles teriam suas consciências sãs, porque seria a consciência herdada de seu Criador. Além do mais, eles seriam todos sãos. Nada de câncer, AVC, epilepsia, Alzheimer, cegueira, surdez, loucura, autismo, gripe, infarto, AIDS, cáries, torcicolo, dor de barriga, bicho-de-pé.
Abolidos a dor, o sofrimento, as doenças do corpo e da mente, a indiferença e o desamor de cada um por seu semelhante, todos os hospitais, presídios, quartéis, delegacias e manicômios seriam transformados em praças; cada farmácia, numa sorveteria. As pessoas se importariam umas com as outras, e se ajudariam mutuamente como um irmão ajuda outro irmão. E todos cuidariam do planeta e do seu futuro coletivo como quem cuida de um jardim.
Um jardim livre de pecados, de serpentes, e de qualquer maldição.  

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